No dia 17 de agosto de 2013 pude registrar parte da manifestação da “Festa da Carpição” no Bairro Capuava. Manifestação que não ocorria no local há alguns anos. |
O Bairro Capuava está localizado na região sul de São José dos Campos.
A palavra Capuava tem origem tupi e significa: “Terreno para roças”e no folclore brasileiro significa cabana, choça.
A “Capela de Nossa Senhora do Bonsucesso” do Bairro Capuava fica em frente ao Club da Embraer e tem mais de 100 anos, hoje pertence à Paróquia Santa Terezinha do Menino Jesus.
Saindo da rodovia dos Tamoios em direção a Caraguatatuba pegamos á direita a estrada para o Bairro. Apesar da estrada de terra e da poeira que nesta época do ano é inevitável o local é bonito e cheio de sítios.
A Capela de Nossa Senhora do Bonsucesso outrora era conhecida como “Capela da Carpição”. N.Sra do Bonsucesso é a padroeira dos que desejam sucesso nos seus empreendimentos.
A devoção de Nossa Senhora do Bonsucesso surgiu no Brasil no contexto da exploração mineral, sempre ligada à descoberta de ouro na região ou no entorno.
A Igreja de N. Senhora do Bonsucesso do Capuava que tem mais de 100 anos esta sendo reformada e ampliada mais uma vez. Da primitiva capela acredito que não exista mais nada. Segundo uma moradora, na década de 60 a capela tinha em seu interior duas grandes colunas, que já não existem mais.
No pátio lateral da igreja, altaneira estava a cruz, feita de madeira com 2 metros de altura e aos seus pés uma pequena quantidade de terra.
Nos fundos da igreja umas barraquinhas montadas para a festa ainda abrigavam os últimos fieis que participavam de um bingo e alguns deles levavam para suas casas os animais arrematados no leilão.
Foi o acaso que me fez passar em frente à Capela exatamente no final da Festa da N.Sra. do Bonsucesso. Era a primeira festa que faziam na capela depois de muitos anos.
Fátima e Rose me informaram que naquele dia o Padre Idiney estava retomando a tradição da “Festa da Carpição” também conhecida como “Festa da Nossa Senhora do Bonsucesso”.
Fatima me contou que as pessoas trouxeram a terra de casa ou recolheram em um barranco nos limites da Igreja. Com a terra nas mãos fizeram uma procissão que percorreu o bairro e depositaram a terra aos pés da cruz fincada ao lado da Igreja, outros levaram um pouco de terra para casa. Segundo ela no passado o trajeto da procissão era mais longo.
Após a procissão rezaram a seguinte oração:“Senhor Jesus Cristo que quiseste experimentar a condição humana para nos libertar do mal, daí nos pela intercessão de Nossa Senhora do Bonsucesso sermos livres de nossos sofrimentos. Vós que viveis e reinais para sempre. Amem.”
A terra depositada aos pés da cruz “se dilui com o sol e com a chuva”.
Perguntei lhe qual o significado de pegar esta terra e deixar aos pés da cruz, e ela me respondeu:
“é entregar para Jesus aquilo que te incomodou durante o ano”
Ela nos contou também que no passado a avó trazia a enxada e levava a terra para casa. A Terra tinha o poder de curar doenças de pele como erisipela, fazer a vaca dar mais leite, manter a saúde ou trazer a cura da criação e das pessoas.
A Festa de N.Sra do Bonsucesso teve procissão, bingo e leilão de animais. |
A Festa da Carpição é a tradição da “terra santa” e é realizada no estado de São Paulo há pelo menos 268 anos. Sabemos de sua ocorrência em algumas cidades do Vale do Paraíba, Guarulhos e algumas cidades de Minas. Em São José dos Campos detectamos no Distrito de São Francisco Xavier e agora no Bairro Capuava e outras localidades. O dia é 15 de agosto ou no domingo mais próximo, porem em minha pesquisa notei que algumas localidades festejavam a “Carpição” na segunda “segunda feira” do mês de agosto.
Os romeiros vão para a igreja em busca da “Terra Santa” e depois colocam essa terra na parte doente do corpo. Esta terra é transportada de várias maneiras. No passado transportavam em lenços usados somente neste dia. Homens, mulheres, crianças... Cachorro, bois, cavalos, porcos, participavam da procissão carregando saquinhos de terra pendurados em seu dorso.
Origem
“O termo “Carpição” parece derivar do verbo “Carpir” (capinar). Por que primitivamente, poucos dias antes da festa em honra a N. Sra. do Bonsucesso (final do mês de Agosto), grande número de pessoas era chamado para fazer a limpeza, para carpir o pátio. Naturalmente mais tarde, como esse serviço era em benefício da Igreja de Nossa Senhora, algumas pessoas iam por devoção, e outras por promessa fazer essa limpeza (carpição).Essas devoções e promessas foram se tornando constantes e consideradas como um ato de mortificação e penitencia a ponto de virem crentes de longínquas distancias trazer esmola, e fazer a “Carpição”.
Atualmente, apesar de não ser necessário fazer está limpeza, pois o pátio é conservado sempre limpo, mantendo a tradição ainda existe na frente da igreja esse espaço para terra.
No dia da festa, a abertura é celebrada com uma missa e faz a benção da terra, para que os fiéis possam repetir o ritual da tradição. “ (1)
“A existência desta tradição no Vale do Paraíba é bastante emblemática, pois foi uma
“Região de pessoas ligadas à exploração do ouro.” (2).
“Este ato está ligado à tradição de se carpir o mato em torno da capela, num sistema de mutirão, que é de origem indígena, tendo em vista a Solenidade Mariana”. Aquela santa, tão poderosa e capaz de descobrir ouro, deveria ser igualmente poderosa em alcançar alguma outra graça, como a cura de doenças ou prevenção de algum mal. Ao se limpar o terreno em volta da capela, removia-se a terra, levando-a para casa, como se faz com outros sacramentais católicos, como a água benta, o óleo e até mesmo o pão bento.” (3) ·.
“A terra, desde a mais remota antiguidade, está associada à vida, à procriação e à regeneração”. Para alguns povos da América, como os incas, a terra é mãe, Pacha Mama, e a ela se faziam oferendas pedindo boa colheita. Para outros, como os astecas, a terra é ambivalente: mãe que alimenta, oferecendo-nos vegetais e caça e, ao mesmo tempo, ventre voraz que devora os humanos, que nela são enterrados.
Na tradição dos indígenas das terras baixas do Brasil é a mulher que se relaciona com a terra sendo responsável pelo plantio dos alimentos, já que no seu ventre a criança é gerada. Esta necessidade de sinal concreto em nosso culto religioso remonta à antiguidade, basta ver o simbolismo do fogo, da água, do sangue em quase todas as religiões. Mas a terra, como elemento de cura religiosa, tal como um amuleto, é inédita no Brasil e certamente em outras partes da América.
Seguramente herdamos de nossos ancestrais indígenas e africanos a necessidade de se ter símbolos materiais eloquentes e eficaz para acompanhar nossa vida. Mas a maior eficácia do efeito terapêutico da terra da carpição está na fé das pessoas que vão ali buscar um auxílio para suas necessidades do corpo e da alma.” Texto de Benedito Prezia (4).
Historia colhida por Dóris Bonini
4 - Texto de Benedito Prezia - http://www.estadomasderechos.org/upload/files/livrodebonsucesso.pdf
Legal, Dóris!
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